Descrição
O SAR integra a Proteção Social Especial (PSE) do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) [i], destinado a pessoas que enfrentem situação de violação de direitos. Situações de violação cobertas pela PSE incluem, por exemplo, pessoas vivendo em situação de rua ou abandono, em situação de institucionalização (ou seus dependentes), ou ainda pessoas sujeitas a diversas formas de violência (doméstica, trabalho escravo, tráfico de pessoas), além de crianças em situação de trabalho infantil.
O serviço consiste na oferta de moradia subsidiada a grupo de pessoas sem condições de moradia e autossustentação, incluindo aquelas impossibilitadas de viverem com suas famílias devido à ocorrência de violações de direito e sua sujeição à violência. Sempre que possível, os grupos a coabitarem cada república devem reunir pessoas com afinidades entre si e capazes de gerirem a habitação de forma funcional. As repúblicas devem ainda priorizar a coabitação por pessoas pertencentes a um mesmo grupo sociodemográfico dentre os listados a seguir: jovens; adultos em processo de saída das ruas; e idosos.
Além da disponibilização da opção de moradia subsidiada, há oferta de apoio socioadministrativo para gestão financeira e funcionamento da moradia, além de acompanhamento psicossocial dos usuários e encaminhamento para outros serviços, programas e benefícios da rede socioassistencial e das demais políticas públicas.
[i] SUAS é a abreviatura do Sistema Único de Assistência Social. Segundo o MDS/MC: “O Sistema Único de Assistência Social (Suas) é um sistema público que organiza os serviços de assistência social no Brasil. Com um modelo de gestão participativa, ele articula os esforços e os recursos dos três níveis de governo, isto é, municípios, estados e a União, para a execução e o financiamento da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), envolvendo diretamente estruturas e marcos regulatórios nacionais, estaduais, municipais e do Distrito Federal.” (GoB, Min. Desenvolvimento Social 2015). O SUAS possui os 12 serviços nacionalmente tipificados listados abaixo (o Relatório Principal desta agenda de pesquisa apresenta uma descrição de cada uma destas e outras iniciativas do sistema de proteção social brasileira).
- Proteção Social Básica (PSB)
- Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
- Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos
- Serviço de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas
- Proteção Social Especial (PSE)
- Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias Indivíduos
- Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias
- Serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC)
- Serviço Especializado em Abordagem Social
- Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua
- Serviço de Acolhimento Institucional
- Serviço de Acolhimento em República
- Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora
- Serviço de proteção em situações de calamidades públicas e de emergências
Estes serviços subdividem-se entre aqueles da Proteção Social Básica (PSB) e Proteção Social Especial (PSE). A PSB destina-se a apoiar pessoas cuja vulnerabilidade social as expõe ao risco de terem seus direitos violados, mas que ainda não estejam sujeitas a tais violações de direitos. Vulnerabilidades que expõem as pessoas ao risco de terem estes direitos violados incluem insuficiência de renda, dificuldade de acesso a serviços públicos essenciais (como saúde e educação), e situações que fragilizam o convívio comunitário e familiar (como no caso de famílias com relações disfuncionais ou pessoas sem vínculos com suas comunidades). Violações de direitos, como já dito, são objeto da Proteção Social Especial (PSE) do SUAS, e referem-se a situações como o abandono, maus tratos físicos e/ou psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas socioeducativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras.
Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome – MDS (que durante o período 2019-2022 foi designado Ministério da Cidadania – MC), mediante estrutura gestora interfederativa do SUAS. O financiamento é coparticipativo entre os três níveis de governo: municipal, estadual e federal.
Estados e, sobretudo, Municípios, por meio de repúblicas geridas com apoio de equipes técnicas do CREAS, ou por equipes contratadas e supervisionadas por um CREAS.
Ainda em funcionamento.
É principalmente um serviço de acolhimento institucional (habitação) temporário, que serve como um componente de apoio familiar, promoção da cidadania, prevenção de isolamento, etc.
Não possui condicionalidades.
Jovens entre 18 e 21 anos egressos do SAI, adultos em processo de saída das ruas e idosos com condições de desenvolver, de forma independente, as atividades da vida diária.
Formas de acesso:
- Por encaminhamento de agentes institucionais do Serviço Especializado em Abordagem Social;
- Por encaminhamentos do CREAS, demais serviços socioassistenciais e/ou de outras políticas públicas;
- Demanda espontânea.
A avaliação da elegibilidade é feita por avaliação própria das equipes socioassistenciais, com alocação das vagas segundo ordem de petição do benefício, havendo priorização de casos encaminhados por outros serviços da Proteção Social de Alta Complexidade e, sobretudo, segundo encaminhamentos do Sistema de Garantia de Direitos (SGD) [i].
Há esforço sistêmico para inscrição das pessoas beneficiadas no Cadastro Único (embora esta não seja exigência que obrigatoriamente barre o acesso à iniciativa de quem porventura não for inscrito no Cadastro Único). A inscrição de pessoas beneficiadas no Cadastro Único é feita muito mais como forma de viabilizar o referenciamento para outras políticas às quais a pessoa seja elegível.
As informações declaradas ao Cadastro Único têm natureza fundamentalmente autodeclaratória. O Cadastro Único realiza cruzamentos anuais junto a outros registros administrativos para validar suas informações, que são autodeclaradas pela população. Casos de inconsistência apontados por estes batimentos, no entanto, não geram interrupção no acesso aos serviços nacionalmente tipificados do SUAS (muito embora possam gerar tais impedimentos para outros programas usuários da ferramenta e cuja elegibilidade seja definida por critérios mais paramétricos de renda e composição familiar, como por exemplo, o Programa Bolsa Família – PBF e o Benefício Prestação Continuada – BPC). Ainda assim, o vínculo com o SAR gera oportunidade de realizar atualizações cadastrais de suas pessoas beneficiadas cujas informações declaradas venham a ser questionadas pelos cruzamentos com outras bases de dados.
[i] O SDG é formado por diversas instituições, como por exemplo: órgãos públicos federais, o Ministério Público, as Defensorias Públicas, a Advocacia Geral da União e procuradorias gerais dos estados, policiais e delegacias especializadas, conselhos tutelares, ouvidorias e entidades de defesa dos direitos humanos incumbidas de prestar proteção jurídico-social, Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, dentre outros.
Embora o Registro Mensal de Atendimentos (RMA) do SUAS não disponibilize insumos para estimar-se a cobertura do SAR tomado individualmente, o Censo SUAS Unidades de Acolhimento expressa a cobertura agregada do SAR e do Serviço de Acolhimento Institucional (SAI), indicando 1.047.063,00 pessoas beneficiadas individuais por ano [i].
[i] (GoB, Min. Cidadania 2022g)
Moradia subsidiada para pessoas em situação de rua ou sem condição de autossustento, dispostas a coabitarem com seus pares e gerirem a habitação de forma relativamente autônoma, embora com apoio de equipe socioassistencial.
A equipe socioassistencial também oferece serviços e atividades para suporte à plena conquista da autonomia e inserção profissional. Há liberdade para determinação destas atividades e serviços segundo cada contexto, mas geralmente estas devem orientar-se segundo categorias como as listadas no RMA para monitoramento da iniciativa.
• Atividades sistemáticas:
- Visitas domiciliares da equipe técnica da Unidade à família da(o) usuária(o);
- Reuniões com grupos de famílias das(os) usuárias(os);
- Atendimento psicossocial individualizado;
- Atendimento psicossocial em grupos;
- Atendimento psicossocial das famílias das pessoas acolhidas (orientação familiar);
- Palestras / oficinas;
- Elaboração de relatórios técnicos sobre casos em acompanhamento;
- Discussão de casos com outras(os) profissionais da rede;
- Encaminhamento para retirada de documentos;
- Passeios com usuárias(os);
- Promove contato e a participação da família na vida da(o) usuária(o);
- Promove atividades com participação da Comunidade;
- Promove a participação das pessoas acolhidas em serviços, projetos ou atividades existentes na comunidade;
- Envio de relatório semestral para o Judiciário (exclusivo para acolhimento de criança/adolescente);
- Acompanhamento escolar;
- Organização e discussão das rotinas das Unidades com as(os) acolhidas(os).
• Atividades para apoiar crianças/adolescentes transitando para a maioridade:
- Apoio para o jovem egresso para a qualificação profissional e trabalho remunerado;
- Apoio para continuidade dos estudos;
- Encaminhamento para república;
- Identificação de rede parental, amigos que possam apoiar o adolescente nessa nova fase;
- Atividades que desenvolvam a autonomia quanto ao uso e gestão do dinheiro;
- Atividades que desenvolvam a autonomia quanto ao autocuidado e cuidado com a residência;
- Atividades que desenvolvam a autonomia quanto a utilização de serviços públicos e comunitários.
Pessoas beneficiadas passam a residir nas repúblicas (residências coabitadas e cogeridas), onde recebem apoio socioassistencial adicional.
O financiamento do SUAS é compartilhado pelos três níveis de governo (União, estados e municípios). Os recursos são alocados em blocos e pisos, que dispõem de certa flexibilidade para financiar as diversas iniciativas do SUAS (ver Policy Brief sobre financiamento do SUAS). A tabela abaixo ilustra as execuções orçamentárias (cofinanciamento) da União destinadas a ações discricionárias da Secretaria Nacional de Assistência Social/ Fundo Nacional de Assistência Social (SNAS/FNAS) entre 2002 e 2022 (em valores reais corrigidos para 31 de dezembro de 2022). Estes valores englobam todo o universo de serviços, programas, custeio das atividades de gestão e investimento do SUAS, portanto não se referem apenas aos custos do SAR.
Execuções orçamentárias da União com ações discricionárias do SNAS/ FNAS entre 2002 e 2022 (em valores reais corrigidos para 31 de dezembro de 2022) [i]
Ano | R$ Milhões de BRL |
2002 | 3.885,20 |
2003 | 3.023,38 |
2004 | 2.308,34 |
2005 | 3.208,81 |
2006 | 2.615,90 |
2007 | 3.039,44 |
2008 | 2.902,20 |
2009 | 2.957,95 |
2010 | 3.252,75 |
2011 | 3.049,13 |
2012 | 4.040,07 |
2013 | 4.587,86 |
2014 | 4.320,93 |
2015 | 3.457,79 |
2016 | 3.485,66 |
2017 | 2.899,13 |
2018 | 2.995,74 |
2019 | 3.628,10 |
2020 | 5.010,93 |
2021 | 1.281,80 |
2022 | 2.295,75 |
Embora não tenhamos encontrado valores consolidados sobre os recursos direcionados especificamente para financiamento do SAR, assume-se que os Pisos Fixos de Alta Complexidade I e II (nomeadamente, Piso de Alta Complexidade I – Criança/ adolescente; Piso de Alta Complexidade I, Piso de Alta Complexidade II – Pop de Rua – Serviço de Acolhimento para Adultos e Famílias; e Piso de Alta Complexidade II – Residência Inclusiva) sejam os mais direcionados ao financiamento do SAR, do Serviço de Acolhimento Individual (SAI) e do Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora (SFA/PFA). Em 2022, a União transferiu um total de R$ 73.065.520,73 para este Pisos [ii] (valor correspondente a 5% dos gastos totais da União especificamente direcionados aos 12 serviços socioassistenciais nacionalmente tipificados pelo SUAS neste ano).
[i] Dados de 2002 a 2020 extraídos de (GoB, Min. Cidadania 2021d), e dados de 2021 e 2022 extraídos de (GoB, CGU 2022). Correção monetária de valores feita utilizando-se a Calculadora do Cidadão do Banco Central do Brasil (GoB, Banco Central, s.d.)
[ii] Valores dos pisos extraídos de (GoB, Min. Desenvolvimento Social 2023a) e associados a serviços específicos segundo interpretação dos autores a partir de (GoB, Min. Desenvolvimento Social 2013; Ministério Público da Bahia, s.d.)
Estudo acadêmico quase-experimental aponta que a implementação do SUAS gerou expansão e melhoria na oferta de serviços, bem como melhoria da capacidade administrativa no nível municipal, mesmo controlando-se para fatores políticos mais específicos [i].
Não identificamos, porém, estudos robustos sobre os impactos do SAR de forma mais específica.
[i] (Cavalcante e Ribeiro 2012)
Não há, pois a iniciativa é restrita a maiores de 18 anos, posto que exige autonomia para gestão com maior independência da habitação.
As repúblicas devem ser organizadas em unidades masculinas e unidades femininas, como forma de se resguardar a intimidade das pessoas beneficiadas e reduzir-se o risco de violência e assédio sexual entre coabitantes.
Orientações e referenciamentos para outras redes como educação, saúde e proteção social básica, de média e alta complexidade, além de forte interlocução com o SGD.
As adaptações específicas do SAR variaram bastante em cada contexto, dada a flexibilidade das equipes estaduais e municipais para se adaptarem segundo necessidades específicas de cada contexto. No entanto, houve um conjunto de ações mais estruturantes com efeito sobre o SUAS de maneira geral, como por exemplo:
• Várias equipes municipais elaboraram mutirões voluntários para apoiar o requerimento ao Auxílio Emergencial (AE) via aplicativo, muito embora o SUAS não tenha sido diretamente envolvido no AE.
• O Governo Federal manteve os pagamentos do IGD-Bolsa mesmo com a suspensão temporária das responsabilidades do SUAS em apoio ao programa (e do próprio programa PBF) em 2020 e boa parte de 2021.
• O Governo Federal gerou material instrutivo com protocolos de atendimento diante do desafio de evitar-se aglomerações.
• Por meio da Portaria MC nº 369, de 29 de abril de 2020, o Governo Federal distribuiu R$ 2,4 bilhões ao SUAS como crédito extraordinário distribuído da seguinte forma entre os municípios com maior prevalência de idosos, PCD, migrantes e pessoas em situação de rua:
- R$ 9,1 milhões foram repassados para a interiorização de migrantes e refugiados venezuelanos;
- R$ 158,1 milhões destinaram-se à compra de EPIs para os profissionais do SUAS que atuam na linha de frente, atendendo, por exemplo, idosos acolhidos, pessoas em situação de rua e vítimas de violação de direitos;
- R$ 185,6 milhões foram transferidos para a compra de alimentos a idosos e pessoas com deficiência atendidos na rede do SUAS;
- R$ 577,7 milhões para o cofinanciamento de ações socioassistenciais, de acordo com as necessidades de cada localidade frente à pandemia.
• Por meio das Portarias MC nº 378, de 7 de maio de 2020, e MC nº 468, de 13 de agosto de 2020, foram repassados ainda R$ 1,5 bilhão para: (a) a reorganização das atividades nas unidades do SUAS; (b) a compra de outros itens necessários para lidar com a situação de emergência; ou (c) a ampliação das ofertas socioassistenciais durante a pandemia. Desses:
- R$ 1 bilhão destinou-se especificamente a reforçar as ações de proteção social básica;
- R$ 437,2 milhões destinaram-se especificamente a reforçar as ações de proteção social especial [i].
Além do repasse de recursos, foram lançadas, pelo MDS, diversas notas técnicas orientadoras sobre o trabalho no contexto da pandemia.
[i] (GoB, Min. Cidadania 2022c; GoB, IPEA 2022; IPEA 2021)